Entretenimento – 05/11/2012 – 18:11
RIO – Glória Menezes desliza os dedos pela tela do iPhone à procura das fotos dos seus dois bisnetos, Rocco, de 4 anos, e Dante, de 3. Mostra imagens das crianças concentradas diante de jogos eletrônicos para comentar a precocidade da dupla. Coruja, chama os dois de fofos e diz que o mais velho “será um intelectual”. Aos 78 anos recém-completados, ela também é usuária de acessórios tecnológicos, como iPad. Atriz com 53 anos de televisão, Glória assinou contrato com a Tupi em 1959 e estrelou a primeira novela diária da TV brasileira, “2-5499 ocupado”, exibida em 1963 pela TV Excelsior, ao lado do marido, Tarcísio Meira, com quem está há 50 anos. Assim como o companheiro, é parte da história das telenovelas, mas afirma “não olhar para trás e viver o presente”. Fala com orgulho da sua idade e do fato de ser bisavó. Sem nem pensar em aposentadoria, concilia agora as gravações da série “Louco por elas”, exibida nas noites de terça pela Globo, com as apresentações da peça “Ensina-me a viver”, que comemora cinco anos em cartaz, com uma nova temporada carioca, no Imperator. Os dois trabalhos são parcerias com o diretor e roteirista João Falcão, que escreveu Violeta, a avó do protagonista da série, Léo (Eduardo Moscovis), pensando na atriz. Mãe de Maria Amélia e João Paulo, de um primeiro casamento com um primo distante, e de Tarcísio Filho, Glória fala, abaixo, sobre as mudanças impostas pela passagem do tempo, de vaidade, do trabalho e da morte.
Você parece gostar de tirar fotos com o celular. É ligada em tecnologia e internet?
Tiro muita foto com o celular. Nisso, eu sei mexer. Gosto de fotografar os meus bisnetos, as flores do meu sítio (mostra imagens dela ao lado de orquídeas e girassóis)… Depois, passo tudo para o meu iPad. Eu também leio e respondo os e-mails que recebo. Mas não sou ligada em Facebook.
Como lida com a passagem do tempo?
Tenho orgulho de ter bisnetos e de ter 78 anos. Não adianta eu falar que tenho 60 para as pessoas dizerem: “Nossa, mas está tão acabadinha”. Melhor estar bem para a minha idade. Mas é claro que hoje em dia a minha recuperação é mais lenta. O meu jeito de me movimentar também. No estúdio, eu preciso lembrar às pessoas: “Calma, estou com 78 anos”. O desgaste existe, mas a cabeça está lá, acompanhando tudo.
É muito vaidosa?
É adepta da cirurgia plástica?Plástica a gente faz até um certo tempo, até os 50 anos. A plástica não rejuvenesce mais depois de uma idade. Você acaba ficando uma mulher de 60 com plástica. Eu me cuido, mas não adianta querer esconder os efeitos do tempo.
Com o tempo, você passou a pensar mais na morte?
Não tenho medo de morrer, mas tenho medo de perder as pessoas que amo. Eu senti muito a morte da Hebe (levanta para pegar um café). A gente não tinha muita intimidade, mas se encontrava às vezes. Ela me chamava para conhecer sua casa e nunca fui. Pensei que perdi uma oportunidade. Hebe era uma pessoa com uma vitalidade enorme. Ficava admirada. Mesmo fazendo quimioterapia ela estava sempre linda e maravilhosa. Devia ter seus momentos de tristeza, não se mostrou doente.
Você atua em novelas desde “2-5499 ocupado”. Qual o peso por fazer parte da história da TV brasileira?
Não penso que sou uma pessoa importante e nem tenho isso na cabeça. Só me dou conta de que tenho 53 anos de carreira quando dou entrevista. Estreei na TV em 1959 e assinei contrato com a Tupi depois que ganhei um troféu de atriz revelação em um festival de teatro dirigido pelo Antunes Filho. Eu não olho para trás, nem penso no que vem pela frente. Eu vivo o presente.
Depois de tantas protagonistas, muitas delas mocinhas de novelas, é libertador fazer coadjuvantes como a Violeta, a avó maluquinha de “Louco por elas”?
Se me derem um bom personagem eu tô lá. Sou uma atriz em busca de bons trabalhos. Eu não me importo se não fizer a protagonista. Não quero quantidade, prefiro qualidade. De que adianta ficar meses no ar num blá-blá-blá com texto ruim? Em “Senhora do destino” (2004) minha personagem (a Baronesa de Bonsucesso, que sofria do Mal de Alzheimer) não era a principal, mas foi maravilhosa e fez muito sucesso.
O que mais a interessou em “Louco por elas”?
O João escreveu esse personagem para mim. Quando ele me convidou para fazer a Violeta, peguei uma peruca, um lenço e me produzi como achei que a personagem deveria ser. Tirei essa foto (mostra a imagem no iPhone) e mandei para ele. Gosto de contribuir com o personagem, até na composição. Além disso, o programa é uma comédia moderna. Não tem piada jogada, você ri das situações. É um humor fino, tem uma direção com um ritmo diferente. E nesta segunda temporada a Violeta realmente está mais maluquinha.
Na série, você contracena com uma criança (Laura Barreto) e uma adolescente (Luisa Arraes). Como é esse convívio?
As crianças hoje em dia assustam a gente. Eu fico boba com a facilidade que a Laura (a Theodora da série) tem de entender o que o diretor pede. Parece que ela tem anos de profissão. Não é criança chata. E a Luisa (a Bárbara) também é escritora e muito inteligente. Tenho longos papos com as duas. Mas já faz um tempo que estou no meio de jovens, até no teatro. Eu fico aberta para tudo.
Não é cansativo conciliar a TV com o teatro?
Nesta profissão, se você não tiver uma dose de loucura, não faz nada. Mas é uma loucura controlada. Faço a peça e gravo a série. Na época de “A favorita” (2008) eu já estava com o espetáculo e saía como uma louca do estúdio para pegar o avião e me apresentar em São Paulo. Esse espetáculo é ovacionado toda noite. Aplauso é uma coisa, ovação é outra. Digo para os jovens do elenco que isso não é o normal. Eu passei a bater papo com o público no final. Não dava para ir embora.
Já havia experimentado esse retorno no teatro?
Eu emendei três trabalhos sérios e compensadores no teatro. Em “Jornada de um poema” (peça de 2001, em que vivia uma personagem com câncer) eu também conversava com a plateia no final. Inclusive tenho vários depoimentos do público gravados. Naquela época, fiquei sabendo de muita gente que teve câncer e foi curada. Eu terminava a peça nua e morta. Raspei a cabeça por dois anos. Estava no palco com a cabeça raspada e nua. Poderiam ter metido o pau em mim, pela minha audácia. Cheguei a pensar que, se não desse certo, a minha carreira estaria acabada. Depois, ainda fiz “Ricardo III” (2006) e agora estou completando cinco anos com “Ensina-me a viver”.
O seu dia a dia de gravação agora é menos puxado?
Numa novela você grava 20 e tantas cenas em apenas um dia. Mas aqui eu também entro às 11h e saio às 21h do mesmo jeito. A diferença é que na série mexo com comédia e não é tão pesado como um drama de novela. Até em cima do telhado eu já andei para fazer a Violeta.
Fora a sua profissão, o que mais a atrai?
Adoro ir à minha fazenda e mexer nas minhas plantas, mas estou sem tempo por causa do trabalho. Aprendi a gostar da natureza com o Tarcísio.
Você foi casada duas vezes, mas está há 50 anos com o Tarcísio. As pessoas se impressionam com a duração da sua relação?
Eu me casei pela primeira vez aos 18 anos. Tenho três filhos, quatro netos e dois bisnetos. Mas não tenho explicação nem receita para estar há 50 anos com o Tarcísio.
Pensa em parar?
Aposentadoria? Deus me livre de ficar em casa sem fazer nada! Ainda tenho utilidade.
Fonte: O Globo