Geral – 30/03/2012 – 10:03
Cidades desenvolvidas adotaram transporte apenas para trajetos com baixa demanda
Com população superior a de um país como o Uruguai, a zona leste de São Paulo deve receber até 2016 um monotrilho, já em construção, para interligar seus extremos. A mesma alternativa de transporte público foi escolhida pelo governo estadual para ligar a estação Jabaquara à Morumbi, ambas na zona sul da capital. Divulgado pelo poder público como um sistema eficiente, de baixo custo e curto tempo de construção, o monotrilho pode ser apenas um tapa-buraco diante da enorme demanda de mobilidade da cidade, de acordo com especialistas em transporte urbano ouvidos pelo R7.
Segundo o Metrô, o Expresso Monotrilho Leste terá capacidade para transportar cerca de 40 mil passageiros por hora em cada sentido. O número representa metade do que a linha 3-Vermelha (Corinthians/Itaquera – Palmeiras/Barra Funda) transporta atualmente. Para a arquiteta Áurea Mazzetti, diretora do Sasp (Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo), a demanda na capital paulista é muito superior à capacidade dos monotrilhos, que seriam uma escolha acertada apenas em cidades pequenas.
- A zona leste, por exemplo, precisaria de um metrô de alta capacidade para suprir a necessidade de mobilidade da população, que é muito grande. Quando esse monotrilho for inaugurado, já será insuficiente para a região.
A empresa Metrô – responsável pela operação da linha que deve ligar a Vila Prudente à Cidade Tiradentes até o final de 2016 – porém, garante que nos próximos 20 anos o monotrilho vai dar conta da demanda de passageiros na zona leste. A empresa afirma que transportará cerca de meio milhão de pessoas por dia com o Expresso Leste. O número é questionado pelo professor titular da FAU- USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP), Csaba Deák.
- É impossível que o monotrilho transporte esse volume de pessoas porque é um veículo de média capacidade. A demanda por transporte em São Paulo é muito superior ao que nós temos instalado e a zona leste, em particular, é carente de transporte público.
Deák diz que o monotrilho é uma boa alternativa para fazer conexões específicas, como em Paris (França), onde esse tipo de veículo liga parte da cidade ao aeroporto. Ele ressalta que em cidades desenvolvidas a construção do metrô acompanhou o crescimento populacional e os veículos de média capacidade foram utilizados apenas para fazer curtas ligações.
As vantagens do monotrilhos para o governo já foram divulgadas. O custo desse transporte é cerca de 60% inferior ao do metrô e sua velocidade de construção pode ser três vezes mais rápida. O que os especialistas contestam é a eficácia do monotrilho no longo prazo. Principalmente para a população da zona leste, formada por 3,9 milhões de habitantes, de acordo com o Censo 2010 do IBGE.
Tecnologia
O engenheiro elétrico Peter Alouche, que trabalhou por 35 anos no Metrô de São Paulo, diz temer a inexperiência do Brasil com relação à tecnologia do monotrilho. Para ele, a primeira experiência do País com o meio de transporte jamais poderia ter sido implantada em uma linha de grande demanda.
- Todo monotrilho que conheço carrega, no máximo, 25 mil passageiros por hora por sentido e esse [da zona leste] vai carregar muito mais. Isso pode ocasionar problemas e ainda não temos conhecimento técnico para resolvê-los. Eu teria sido favorável a colocar essa tecnologia em sistemas menos carregados até ela se firmar.
Alouche também questiona a estrutura dos monotrilhos para retirada de passageiros em caso de falhas. Segundo ele, é necessário construir passarelas de emergência ao longo da linha.
- A leveza da estrutura também terá que ser revista porque mais carros terão que ser colocados em circulação. A linha da zona leste preocupa porque é monodirecional, sempre vai entupir em algum sentido. Por que já não escolher o metrô então?
Para o ex-secretário de transportes do Estado Getúlio Hanashiro, não há solução para o problema de mobilidade da capital paulista se a rede de metrô não crescer pelo menos 150 km nos próximos dez anos.
- Estamos muito longe disso, porque falta vontade política. O monotrilho é uma solução rápida. Normalmente, quem começa uma obra quer terminá-la ainda no seu mandato.
Paisagem urbana
Outra desvantagem do monotrilho em relação ao metrô apontada pela arquiteta Áurea Mazzetti é a alteração da paisagem urbana. Segundo ela, o impacto visual de uma via suspensa é muito grande.
- Já está impactando muito a paisagem. Claro que não como o Minhocão [Elevado Costa e Silva], que tem estrutura mais larga, mas o impacto visual de uma obra como essa é enorme.
Para a comunidade local, a preocupação é que essa mudança na paisagem urbana provoque uma grande desvalorização imobiliária e prejudique o comércio da região, como explica o morador André Kushar.
- A preocupação é em relação ao elevado na avenida Anhaia Melo, um dos maiores pontos de venda de veículos do país. Os comerciantes estão com a pulga atrás da orelha, com medo da degradação da avenida.
Fonte: R7


