Pesquisa da Fiocruz sobre uso de células in vitro em testes com soro contra veneno de jararacas avança em validação e pode reduzir custos e sofrimento animal
A bióloga Renata Norbert, do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz), recebeu reconhecimento internacional por seu estudo inovador que propõe substituir o uso de camundongos por ensaios in vitro no controle de qualidade de soros antiofídicos, utilizados contra o veneno de cobras do gênero Bothrops.
A pesquisa foi premiada no 13º Congresso Mundial de Alternativas ao Uso de Animais em Testes, promovido pela Sociedade Europeia para Alternativa de Testes em Animais. O estudo também recebeu menção honrosa do Centro Nacional para a Substituição, Refinamento e Redução de Animais em Pesquisa (NC3Rs), do Reino Unido.
JARARACA
As cobras do gênero Bothrops, como jararacas, urutus e cotiaras, são responsáveis por cerca de 90% dos casos de envenenamento por serpentes no Brasil. Dados do DataSUS apontam mais de 12 mil acidentes apenas em 2025.
A picada dessas serpentes pode causar hemorragias, necroses, amputações e até a morte. Apesar da gravidade, o tratamento com antiveneno é considerado uma “doença tropical negligenciada” pela OMS, por não atrair interesse da indústria farmacêutica privada.
MÉTODO
A proposta de Renata Norbert é substituir os roedores por células Vero, cultivadas em laboratório, para testar a eficácia do soro. As células são fixadas em placas e expostas à mistura de veneno com soro. Se permanecem íntegras, o soro é considerado eficaz. Se forem danificadas, o soro é reprovado.
Segundo a pesquisadora, o novo método já alcançou a fase de pré-validação, um marco inédito no mundo para antivenenos. Agora, outros laboratórios estão testando a mesma técnica para comprovar sua reprodutibilidade e robustez.
CUSTO
Além de eliminar o sofrimento dos animais usados em testes, que são posteriormente sacrificados, a substituição por células in vitro representa um avanço logístico e financeiro.
“É um teste rápido, simples e que reduz em até 69% os custos”, afirmou Renata. Enquanto os camundongos levam cerca de um mês para estarem prontos para os testes, o novo método libera resultados em uma semana.
VALIDAÇÃO
A expectativa é que, até março de 2026, o método esteja pronto para ser implementado na prática. A próxima etapa será submeter os resultados à farmacopeia brasileira e distribuir kits com a metodologia para que laboratórios possam aplicá-la.
“Vamos comparar os resultados, fazer análises estatísticas e verificar a reprodutibilidade. Se outros laboratórios tiverem os mesmos resultados que tivemos no INCQS, isso será decisivo”, explicou a bióloga.
EXPANSÃO
Com o reconhecimento internacional, Renata pretende ampliar o estudo para além do Brasil. “Queremos incluir laboratórios de outros países onde há Bothrops, como a Costa Rica, por exemplo. A metodologia pode ser adaptada para diferentes espécies”, disse.
O INCQS já utiliza metodologias in vitro para liberar vacinas. Para venenos, a proposta é pioneira. A bióloga destaca que, se o método funcionar com a Bothrops jararaca, há potencial de aplicação para outras espécies, como a Bothrops asper, presente na América Central.
IMPACTO
Testes com antivenenos feitos atualmente em camundongos causam extremo sofrimento. Os animais passam por procedimentos dolorosos e sem anestesia, sendo sacrificados após o uso.
Segundo Renata, a substituição representa um avanço ético, técnico e econômico: “Queremos transformar essa pesquisa em prática. A ciência precisa andar junto com o respeito à vida, inclusive à dos animais”.
SUS
A produção de soros antiofídicos no Brasil é realizada por instituições públicas como o INCQS, o Instituto Butantan, o Instituto Vital Brazil e a Fundação Ezequiel Dias. Todos fazem parte do SUS e garantem a oferta gratuita do antiveneno à população.
A pesquisa liderada por Renata Norbert é um passo importante para tornar esse processo mais eficiente, ético e acessível.
Com informações Agência Brasil


